SÁBADO COM MARGARIDAS
——Yupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
——Que alegria mais
alegre, Rospo!
——É sábado,
amiga!
——Já
sabadofiquei-me, estou enlaçada pelo sábado. Pura alegria! Sou alma
de cigana em coração de circo. Sou ramalhete de solfejo, de
almejar...Veja-me.
——Nem precisa
pedir, meu bem. Tudo está mais do que se quer... Seu esmalte, lilás,
seu vestidinho. Sábado é tudo de bom. Vamos?
——Vamos! Mas, antes
da Padaria Rubi, vamos passar na Praça Luar Azul.
——Hoje é sábado,
isso faz lembrar moqueca de peixe...
——Moqueca de peixe
onde?
——Em Luanda?
——Em Lisboa?
——Viva que a vida anda. Viva que ela é boa!
——A vida não tem
jeito, que me venham todos os portos, todas a neblinas, todos os
seguros cais, todos os poemas, estilhaço-me no alto da lua, sou
navegante de todos os quereres...
——Uau! Uau! Uau!
Quem vai lá, querida amiga?
——Vai galopando,
por acaso? Na alvorada, no ocaso?
——Não! Se
rastejando, de forma insinuante, ondulada, gosmenta...
——É a inveja.
Tchau, bobona! Sapinhas, nem façam careta quando ela estiver
passando. Deixe que ela vire fumaça, poeira...
——Feliz me quero.
Vamos que a sedenta pede licor de anis.
——Sedenta?
——A velha boca
sedenta da água do riacho da poesia... Sedenta de poemas, sedenta de
palavras azuis... de beijos, de realejos...
——Rospo, eu amo...
——Eu sempre soube,
está em cada gesto seu...
——Rospo, deixe-me
completar. Sou puro amor. Só acredito nisso. Amar. Nada além disso.
Se não tiver amor, não vale. E quando se sentir desamparado, pense
em Amparo. E quando se sentir num desafeto, pense no afeto... Ou
melhor, aja no afeto.
——Amo uma
margarida.
——Do que fala, meu
anjo encapetado?...
——Encapetado? Uau!
Desnorteado jamais. Diga...
——Diga você, quero
saber dessa margarida.
——Sim, eu a vi pela
primeira vez num campo orvalhado de um sábado, e não estava só,
era um campo repleto de margaridas, todas brancas com aquele miolo de
girassol, bem pequeno, para onde isso foi, minha amiga?
——Em outros
lugares, Rospo, pode até procurar no lugar mais certo, em você...
——De uma coisa
esteja certa, minha ciganinha, eu a guardo em mim, aquela
aparentemente frágil e singela margarida, pois sua fragilidade é
pura ilusão.
——Fale disso,
Rospo. Quero saber, pois a margarida para mim é frágil como a miosótis...
——Puríssimo
engano, minha amiga. Nem um nem outro é frágil. E a fortaleza da
margarida está em mim, em cada sapo e em cada sapa que um dia na
infância a viu, e diante dela se deteve pelo menos por uns
segundos... Que são os instantes preciosos da vida... Quem viu a
margarida com os “Olhos de Ver” de Tatiana Belinky, quem a viu, a
levou vida fora...
——Que bonito, mais
bonito só Cesária Évora!
——A boniteza é
apenas uma opção do olhar que não desiste... Você já desistiu de
algo, Sapabela?
——Rospo,
explique-me esse verbo...
——Deixe pra lá.
Sapabela, hoje é sábado! Paz na Terra aos sapos que compreenderam a
imensa força da margarida na edificação da alma de um sapo.
——Sim, uma flor não
é apenas uma flor, mesmo que esteja num charco. Uma flor é muito
mais do que apenas ela.
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 825
Marciano Vasques
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 825
Marciano Vasques
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