quinta-feira, 1 de abril de 2010

PÉGASO




PÉGASO
 
Dânae corre, despreocupada, pelo campo florido, cabelos soltos, dourados, contracenando com o sol entardecido.
Crianças brincam como inflorescências, uma delas aponta para a moça e comenta: - Como é linda! O pai, Acrísio, a observa do alto do palácio. Queria um filho.

Foi ao oráculo. Não devia ter ido.

Voltou sobressaltado. O coração esmagado pela triste profecia oracular.

Ele não teria um filho homem e seu neto o mataria.

Retornou com as palavras do oráculo martelando em sua cabeça.

Estranhas varizes apareceram na região umbilical, 

Seu corpo cambaleante entrou no palácio.

Seus olhos quedaram num cansaço inatingível, ou melhor, tingido pelo pavor de uma profecia inaceitável pela sua mortal fragilidade. 

Acabou nesse dia o sono tranqüilo do velho rei de Argos.
Ao retornar do oráculo, voltou a observar a jovem filha entre os crisântemos amarelos. O que era amor e admiração, o que era orgulho e contemplação, virou ameaça.

Com a dor penetrando em cada sulco do rosto, tomou uma decisão.

Prendeu a filha numa torre alta.
No pensamento, um pedido de perdão, nos olhos lágrimas fugitivas que se estraçalhavam na brisa sufocada que percorria o frio corredor que os levava para a torre.

Para chegar até a torre, eles teriam que passar por um longo corredor e abrir várias portas de bronze, depois subir no escuro os degraus intermináveis de uma escada rústica e tortuosa.
O terror instalou o seu reino no coração do rei e mesclou-se ao remorso, mas a fortaleza do medo às vezes se torna insuperável.

Trancando a filha, o apavorado rei podia dormir em paz, mas não conseguia.
Quando pegava no sono, pela madrugada, ouvia uma voz fria e pesada, que inicialmente num sussurro, parecia vir de lugares distantes ou de outro mundo, dizendo: A profecia é inevitável! Ninguém engana os destinos do oráculo!

O rei tremia em seu leito, o suor invadia o seu rosto e ele se levantava agonizado pelo sono e pelo cansaço.
Olhava a escura torre e momentaneamente se sentia seguro.

Certa noite, sonolento, viu pelas aberturas do quarto uma queda de fios de ouro espalhando  as ramas sobre a copa de uma árvore. Uma visão maravilhosa, mas não se deu conta do que se tratava. Dormiu.

Dizem que enquanto a humanidade dorme, deuses sedutores costumam viajar em chuvas de ouro !
Dânae, de Ticiano

Zeus penetrou na torre.

Fecundada, Dânae engravidou.

Deu à luz a um filho, ao qual chamou de Perseu.

Acrísio quis matar a filha e o fruto do seu ventre. O medo sem freios estabelece a loucura.

Desistiu da idéia. A força de Zeus removeu o seu poder de decisão. A covardia já governava a vida do pobre homem.

Embora Zeus tivesse engravidado a sua filha, para o rei a sua ira era algo impensável.
Lançou Dânae com o filho ao mar, em uma pequena porém sólida embarcação, uma arca de madeira.

A arca enfrentou as procelas do mar, as revoltas aquáticas, e seguiu o seu caminho desconhecido.

A mãe agarrava o pequeno filho ao peito e implorava às espumas do mar: “O que será de nós? 

Erguia os olhos molhados e aflitos para as nuvens, mas só via a morte. 

Não compreendia porque morreria naquela imensidão.

O mar, em cada onda gigantesca manifestava a sua fome de vidas.

A mulher pediu ajuda a Zeus.
Com a suposta intervenção divina, o mar em vez de saciar a sua fome, se acalmou.

Misteriosamente, as águas se acalmaram e a arca chegou com o pequeno Perseu e a sua mãe à ilha de Serifos.

Mortalmente arrasada, a mulher, cansada, extenuada, sem forças, desfaleceu na areia com a indefesa criança.

Dormiu amamentando o filho.
Foram encontrados por um bondoso pescador chamado Dictis, ironicamente irmão do rei da ilha.

Mãe e filho viveram na nova terra.

O tempo passou.

Perseu já era um belo moço. Dânae, mesmo com todo o sofrimento, jamais perdeu a sua beleza natural.

Um dia, o rei da ilha, Polidectes, manifestou o seu desejo por Dânae.

Qualquer um que a observasse diariamente, por ela se apaixonaria.

Mas ela não o aceitou.

Um rei não se acostuma com recusas, porém a presença altiva de Perseu o desanimava de empreendimentos amorosos, e ele logo descartou qualquer tentativa contra a vontade de Dânae.

Mas Polidectes não nascera para ficar cultivando infrutiferamente um desejo.  A sua cobiça teria que apresentar resultados práticos.

Impedido do poder de investidas, começou a ficar atormentado.

Só havia uma saída.
Para conseguir o seu objetivo carnal o rei teria que se livrar de Perseu. O desejo parece enigmático, mas talvez seja apenas banhado pelas águas do egoísmo.

Polidectes ofereceu um banquete para todos os jovens da sua aldeia. 

Perseu abraçou a mãe antes de partir para o banquete. O coração da mulher, inexplicavelmente estremeceu.

Os convidados compareceram, cada qual com um presente, menos Perseu, que, sem recursos, não tinha nada para levar.

A maioria dos convidados oferecia ao rei um cavalo.

Perseu não tinha posses para adquirir um desses animais.

Sabia o quanto o cavalo era valorizado na ilha por ser muito apreciado pelo rei.

Como Perseu não tivesse nada para ofertar, o rei pediu algo inusitado:  “Traga-me a cabeça da Górgona Medusa!”

Todos ficaram espantados com o pedido de Polidectes. Os jovens se olharam perplexos, um frio percorreu o ambiente, atravessando a mesa e se instalando no coração de cada um.

Os olhares aflitos se dirigiram para Perseu.Todos pressentiram a tragédia que se aproximava.
Ninguém podia realizar tal coisa, o presente significava a morte de Perseu.

Por uma centelha de instante todos os convidados ficaram petrificados, mas era o pedido de um rei, portanto irrecusável.

Somente uma mulher se atreveu um dia a desconsiderar isso.
Quando soube, a mãe ficou angustiada. Como o filho poderia realizar tal tarefa?

O seu coração feminino, sempre atento, compreendeu a armadilha na qual o seu filho caiu. O pedido do rei simbolizava o presente impossível.
E o que estava por trás disso –refletiu- era o desejo imbatível do rei. A sua natureza de fibra, que ela transmitiu ao filho, incomodou o poder de Polidectes.

Porém, quando corria entre os jovens amarelos dos crisântemos, não aprendera a ceder.

As Górgonas eram terríveis.

Nas aldeias, em todas as ilhas, nos rios, nas florestas, em qualquer lugar onde habitasse um ser humano, só a menção da palavra Górgona trazia terror.

Diziam os povos que até os deuses temiam tais criaturas.
Descendentes de Gaia, filhas de Fórcis e Ceto, eram três irmãs monstruosas de horrível aspecto, longas cabeleiras compostas por serpentes.

Nos olhos o poder de petrificar qualquer criatura.

Bastava um mortal olhar para uma delas.

Habitavam no país das sombras.

Três irmãs, uma delas vulnerável à morte. Seu nome, Medusa. A rainha.
A mais temida. Seu sangue tinha poderes mágicos. Com uma gota dele podia envenenar ou ressuscitar alguém.

Contam as lendas que já havia matado muita gente e ressuscitado muitos mortos.

Segundo alguns relatos, na própria ilha de Polidectes, foram encontrados animais petrificados na beira do rio.

As próprias irmãs Esteno e Euríale a temiam.
Uma única serpente de sua medonha cabeleira devastava um exército.

Medusa era uma linda jovem que recebeu um castigo divino.

Quis superar em beleza a deusa Atena. E deusas são ciumentas!

Veja no que foi transformada a pobre.

Também contam que a deusa se sentiu ofendida porque Medusa usou o seu templo, um lugar sagrado, para fazer amor.
A única mortal das Górgonas desafiara em sua juventude uma deusa. Pagou caro por isso!

Perseu ficou só para pensar. Andou por entre os galhos, as rochas, olhou o mar, o céu, não encontrava uma saída.

Mas contou com uma ajuda inesperada.

Zeus!
Comovido com a situação do filho da sua aventura, o deus dos deuses enviou dois imortais para ajudá-lo.

Atena e Hermes, o mensageiro.

Cada qual desceu do Monte Olimpo e se dirigiu para a ilha de Serifos.

Atena emprestou a Perseu seu escudo, Hermes, uma foice.
Perseu foi orientado pela deusa para que desviasse o olhar da Górgona e olhasse apenas o seu reflexo no escudo. Assim ele escaparia da maldição e não seria petrificado.
Hermes indicou-lhe o local onde estaria a Ninfa do vento Norte.
Quando chegou até a estonteante Ninfa de longos cabelos azuis e transparentes vestidos de seda, esvoaçantes como o vento das florestas, recebeu como empréstimos sandálias aladas, uma rede e o capacete da invisibilidade usado por Hades, senhor do inferno, que muito contrariado, o acabou cedendo à delicada Ninfa.

Perseu, bronze de Benvenuto Cellini Instrumentalizado pelos deuses, o corajoso Perseu partiu.

Chegou ao local onde medusa dormia sobre uma enorme pilha de estátuas.

O valente Perseu reconheceu algumas das imagens petrificadas. Heróis que haviam desaparecidos.

Olhou para o reflexo de Medusa no escudo de Atena. Ficou impressionado com a enorme cabeça da criatura e ao mesmo tempo, por um átimo de segundo, penalizado pelo castigo que lhe fora imposto.

- “Terá mesmo sido uma linda jovem?” - chegou a questionar, mas o seu pensamento tinha que ser veloz e naquele momento não podia vacilar com indagações. 

Com um único golpe da foice arrancou a cabeça do monstro e imediatamente a jogou na rede.


Então do corpo dela saltou o maravilhoso Pégaso.

Perseu se encanta com o fantástico animal. E sente um súbito orgulho por tê-lo libertado.

Passou a carregar a cabeça de Medusa como um troféu. Com ela petrificaria os inimigos.

Ao voltar para casa, viu uma moça amarrada num rochedo beirando um lago. 

Aproxima-se e pergunta:

-Quem é você?

-Andrômeda.

A bela moça conta a sua história.


Enquanto a ouve, no coração de Perseu brota uma paixão.
-A sua mãe -conta Andrômeda- Cassiopéia, proclama-se mais bela que as ninfas.

Revoltado com esta declaração, Poseidon castiga os habitantes da região com uma inundação e um monstro marinho.

O seu pai fica sabendo, por intermédio de um oráculo, que a única forma de salvar a todos é oferecer Andrômeda para o monstro.

Após ouvi-la, Perseu aguarda a chegada do anoitecer. Enquanto espera, o seu olhar se perde nos mistérios do luar.

A noite está clara como nunca.

O seu pensamento vaga. Olha ternamente para a jovem aprisionada no rochedo: “Os pais costumam sacrificar suas filhas” -Pensa cabisbaixo. A sofrida moça adormece. Outro dia amanhece. A espera continua.

No final da tarde as águas do lago começam a borbulhar e os pássaros se afugentam.

O monstro aparece.

Perseu expõe a cabeça de Medusa e o petrifica.

Liberta Andrômeda.

Quando retorna à Grécia, está acompanhado de duas mulheres.
Uma delas é a sua mãe, transformada em escrava por não ter cedido ao rei. E que ele, Perseu, libertou da ilha de Polidectes, após transformá-lo em estátua. 

A outra, a esposa Andrômeda.

É recebido com festas.

Uma profecia do oráculo sempre se concretiza.

Um dia ele estava atirando um disco e sem querer atingiu Acrísio. Matou assim, acidentalmente, o avô.

Imediatamente se alastrou entre os povos que foi a vontade dos deuses, que estão sempre em comunhão com os oráculos.

O maravilhoso cavalo alado que fora entregue por Perseu para Atena quando foi fazer a devolução do escudo, agora é entregue pela deusa para Belerofonte, cuja missão era matar a Quimera.

Quimera:o temido monstro tri-corpóreo. Parte leão, parte bode, parte serpente.

O herói domou Pégaso com uma rédea fornecida por Atena.
Assim, montado no maravilhoso cavalo alado, com uma lança mata a monstruosa Quimera.

Todos temiam a horrível criatura, mas poucos acreditavam na sua existência.

Perseu realizou várias façanhas, a maior certamente foi ter matado a medusa. Para muitos o seu maior feito foi ter libertado Pégaso.

Independente da predileção de cada um, foi aclamado como herói e festejado em todas as regiões por onde passou.

Mas, continuou vivendo em sua simplicidade.

Belerofonte, ao contrário, tornou-se vaidoso e após ter realizado o extraordinário feito de destruir a Quimera, despertou a ira de Zeus.

Alguns acidentes, alguns acontecimentos, mesmo que pequenos, só podem significar uma intervenção divina, até mesmo a ferroada de uma vespa.

Belerofonte, vaidoso, julgou-se um deus e montado em seu alado, foi ao monte Olimpo, mas lá ninguém entra assim impunemente. 

Uma vespa ferroa Pégaso, que atira longe o seu montador, que se atreveu a querer ser deus e terminou a vida como mendigo.

Quem olhasse para o céu à noite, conheceria o poder imenso de Zeus.

O cavalo foi transformado em constelação, simbolizando que estava a serviço do deus, transportando os seus raios.

Quando o céu trovejava, cada relâmpago, diziam os pescadores e os homens da terra,trazia em suas faíscas a imagem veloz de Pégaso.

Muitos juraram que, olhando o céu relampejando viram o maravilhoso vulto branco.

Pastando serenamente nos lugares preferidos pelas musas, o maravilhoso alado vivia os seus dias.

Certa vez um coice seu fez nascer a fonte inspiradora dos poetas.

Uma noite, um artesão da palavra, olhando a constelação, perguntou a si mesmo: “Será que com aquele coice ele quis que o poeta fosse o primeiro a denunciar e a defender, com a sua arte, cada animal maltratado?”.

MARCIANO VASQUES

Um comentário:

  1. Cuánto te Trabajo Llevar estas bellas HACER Descripciones de la Mitología.

    La verdad es que es Verdadero regalo sin ser huesped de La Casa Azul en la literatura.

    Al comentar sobre todo, por falta de tiempo.

    Pero quiero que sepas seguir este blog INTERÉS Con Verdadero.

    Un abrazo, Montserrat

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