quarta-feira, 19 de maio de 2010

NAMORADOS SÃO CARTÕES POSTAIS

Marciano Vasques
  

NAMORADOS SÃO CARTÕES POSTAIS

 

 

“Fique sabendo que eu também andei sozinho...”
Antonio Marcos

 

No principio era o príncipe, o principal. E ela, a princesa. Principalmente. Depois, foi crescendo e a moça, feita em flor; a juventude, a rosa, um risco de ternura entardecendo, demorando.
E ele então, que era um rapaz tão distraído, como quase todos, tímido, virou um namorado, namorado. Mas tudo ficava atrapalhado: o caderno, os livros...
Namorada, esperanças de uma tarde ao seu lado, namorada, não era fácil o pedido do namoro. Sempre surgia a tremedeira que atrapalhava tudo e a voz engasgava e sempre se dizia justamente o que não era para dizer e até se inventava uma dor de dente e os olhos dela eram duas esmeraldas e por mais esmero que houvesse não tinha jeito, nunca dava certo, nunca saía do jeito planejado.
Havia em cada esquina um baile, quase em cada casa uma menina, e um adolescente que queria namorar. E da calçada podia se ouvir A Wide Shade of Pale, aquela maravilha, e também tocava Creedence Clearwater Revival e aquela outra canção dele, mas com palavras não sei dizer.
Depois, no portão do colégio, não é fácil a entrega do bilhete. No cinema um filme, mas o tempo foi passando, e Charlton Heston envelheceu, e o filme foi para locadora.
Quando chove me lembro de você, e toda vez que chove uma canção que o vento levou. E o tempo já me levou a namorada da canção. E Antonio Marcos cantava, e a Martinha e o Roberto. “Se eu fosse você, eu voltava pra mim”. E bem mais longe, lá na mina da água cristalina, “tenho ciúmes de tudo” e “Quem é que não sofre por amor?”, e então Nirvana e as grafites e o e-mail e a hipermídia. E o amor buscando novas formas para se pronunciar.
O tempo não para, poeta. E os namorados estão aí, alguns querendo namorar, nas luzes do Parque Marisa, de Itaquera, e outros vão ficando. E no metrô, no shopping,  na Puc, na USP, em todos os lugares.
Um veio de Alagoas, outro de Pernambuco, ela veio do Paraná, eu sou mineira. Alguém telefonou. Pediu uma ficha emprestada. Agora é celular. Um pastel, um caldo de cana. Agora é fast food. Sou gaúcha, gosto de dançar, de viajar, sou sonhadora.
A menina de blusa rosa e saia branca oferece esta canção para o rapaz que está perto da barraca de bingo, com uma camisa xadrez e uma calça rancheira.
E o inesquecível padre Santiago dizendo ao jovem enamorado que a vida é curiosa.
Quero que você me aqueça, pois estamos em junho. A vida é tão curta e feita de momentos, pois de momentos é feita, assim disse Borges. Não, não importa a autoria. Viver a vida intensamente inclui o namoro. Quem namora é mais feliz.
Namorar sempre. Não importam as circunstâncias, o namoro é um tesouro na vida de qualquer um, talvez um dos melhores medicamentos para o stress, um dos melhores medicamentos contra problemas cardíacos, vasculares, cerebrais, etc. 
Namorar. Tem gente que já perdeu a noção do que é andar de mãos dadas numa calçada assim na avenida Paulista ou em alguma rua do subúrbio, talvez da zona sul, talvez numa tarde azul, numa casa azul.
Namorar, mas namorar serenamente, tranqüilamente, sem conflitos, sem sofrimentos, sem dramas.
Se fosse possível assim ordenar a natureza humana para que os namorados pudessem se desvincular de todos os equívocos e então, tal como se cultiva um jardim apenas por amor e prazer (não para o comércio de flores), extraindo as ervas daninhas, os insetos sugadores, e regando, nutrindo a terra, e depois vendo surgir com as cores o perfume das flores, se assim pudesse ser, como o mundo seria melhor!
O mundo nem sabe disso, mas deve muito aos namorados.
Com eles a praça é um sinal de paz, de harmonia, de felicidade. Uma praça deserta, sem namorados, sinaliza um tempo sombrio, de violência.
Um tempo, uma cidade, nos quais os namorados precisam se esconder, fugir, é um tempo de temores. Afinal eles são como cartões postais de uma cidade. Crianças correndo num parque, pássaros na tarde, flores, namorados...

Cartões postais não apenas da cidade, mas de uma época.
A felicidade de um tempo, a alegria de uma sociedade está nos seus namorados.

Namorados, o dia é de vocês.


Um comentário:

  1. Em Portugal, o dia dos namorados é a 14 de Fevereiro... :)

    Está muito bom o seu texto...

    Claro que namorar é fantástico. :) Eu concordo plenamente.

    Beijinho*

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