quinta-feira, 10 de junho de 2010

NA NOITE EM QUE MORREU JORGE AMADO

Marciano Vasques

NA NOITE EM QUE MORREU JORGE AMADO



Na noite em que morreu Jorge Amado, perguntava para um grupo de cinqüenta pessoas adultas, alunos do oitavo termo de suplência, se alguém sabia quem foi Paulo Freire. Ninguém sabia.
É coisa nossa. Nordestino, brasileiro. Considerado um dos maiores educadores do mundo, aplicou seu método educativo, sua teoria pedagógica do oprimido embaixo de árvores, ao ar livre em regiões distantes, na África, em países de fala espanhola. Ninguém sabia.
Na noite em que morreu Jorge Amado, o Brasil não teve tempo para refletir a sua falta de cuidado para com os seus escritores, e um país que não ama os seus escritores é um país torto. O escritor é o sujeito que entra na sala de aula em forma de livro. 
Jorge Amado é uma prosa diferente de Graciliano Ramos, diferente de Guimarães Rosa. A sua importância está no seu amor pelas coisas da terra, no seu jeito de mostrar a Bahia e ele se encerra nessa cortesia, mostrou o corpo suado do baiano, o vigor do negro, a beleza da mulher, o candomblé, enfim, isso é amado por todos que o leram com o coração aberto. 
Seus capitães de areia não concorrem com os meninos abandonados em São Paulo. A vida real que se apresenta atualmente é mais forte ainda do que suas páginas, mas, a maioria não aprendeu, como queria Paulo Freire, a ler o mundo, a ler a vida, e pode tranqüilamente dizer que Capitães de Areia é uma historia de um livro escrito por um escritor baiano, sem verificar que a história continua...

Na noite em que morreu Jorge Amado o Brasil já estava mudado,  já era movimentado pelo controle remoto. Não foi apenas Jorge Amado que morreu, algo com ele também se vai, algo que já estava partindo, no verde semelhante ao vômito do palavreado estéril, da divagação sem rumo, da intelectualidade infrutífera, um amarelo amarelecido, como jornais abandonados.

Na noite em que morreu Jorge Amado, talvez pensando nas suas mulheres, as que são mais amadas pelo público, como Gabriela, e outras, pouco conhecidas, como Mariana, fiquei pensando no olhar da mulher, diferente do olhar masculino, - olhar difuso, espalhafatoso, sem cuidados, sem lapidação, desorganizado.
O olhar da mulher é o olhar organizado. Então me pus a pensar essas coisas na noite em que Jorge Amado morreu.

4 comentários:

  1. BOM DIA!
    PARANDO FRENTE À SUAS PALAVRAS E REFLETINDO DE MIM PRA MIM PUDE COMPREENDER QUÃO PEQUENINOS PARECEMOS DIANTE DO MUNDO QUANDO ATRAVÉS DE PALAVRAS NOS PROPOMOS A FAZER UMA MUDANÇA DE CONSCIÊNCIA COLETIVA.
    FREIRE ALMEJAVA ENXERGAR EDUCADORES PRONTOS A REFLETIR SOBRE SUA PRÁTICA E ISSO SE APLICA HOJE EM DIA EM POUCOS CASOS CREIO EU. AINDA ESTAMOS POUCO ABERTOS À CRÍTICA DE OUTRO SER DITO AQUI INFERIOR POR NÃO TER A GRADUAÇÃO, O CANUDO, O DIPLOMA...
    NESSE MUNDO CAPITALISTA E SELVAGEM REFLEXÃO TEM QUE VIR APOIADA EM UMA GRADUAÇÃO PRA SER TIDA COMO VÁLIDA E NEM TODOS OS PENSADORES TIVERAM A OPORTUNIDADE DE GRADUAR-SE PRA TER SEU PENSAMENTO DIGNO DE DISCUSSÃO.
    LI UM POUCO DA OBRA DE JORGE ( O QUE PUDE CONSEGUIR NA PEQUNA BIBLIOTECA DA CIDADE) E TODAS ENCANTAM, MESMO A INFANTIL O GATO MALHADO E A ANDORINHA SINHÁ TEM SEU FUNDO REFLEXIVO AQUILO QUE FREIRE TANTO ALMEJOU O ESTÍMULO DO PENSAMENTO CRÍTICO DO SER HUMANO. O SOLTAR AS AMARRAS DA MENTE E NÃO DEIXAR-SE ALIENAR.
    DE JORGE ME FICOU O AR DE GABRIELA O GATO MALHADO A CAMINHO DA MORTE OS PEQUENOS CAPITÃES DE AREIA MARGINALIZADOS, E DE FREIRE ME FICOU A FRASE:
    AOS ESFARRAPADOS DO MUNDO,E AOS QUE NELE SE DESCOBREM E, ASSIM DESCOBRINDO-SE, COM ELES SOFREM, MAS SOBRETUDO, COM ELES LUTAM...
    E ME PROPUS A LUTAR, POIS ACREDITO QUE VALERÁ A PENA
    ENTÃO ... LUTEMOS PARA QUE A MAGIA DAS LETRAS NÃO SE PERCA COM ESSA PARAFERNALHA TECNOLÓGICA E QUE A NOVA GERAÇÃO SINTA PRAZER NO CHEIRO GOSTOSO DO PAPEL ENVELHECIDO E MANUSEADO E O SABOR DAS PALAVRAS QUE VÃO CRIANDO TEXTURA NA BOCA COMO UM BOM DOCE.

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  2. Olá,
    Boa noite!
    Na verdade, o mundo precisa de gente como você, com o seu olhar. O livro infantil de Jorge Amado foi escrito para o seu filho e publicado anos depois. É um encantamento. O Brasil não conhece o Brasil. Tudo parece descer ladeira abaixo. Estamos vivendo uma época de pleno desmanche cultural. A música está triste e feia, infelizmente, e tantas coisas mais. Jorge Amado, Paulo Freire, Augusto Boal, Plínio Marcos, Henfil... A memória seria um tesouro primordial do Brasil.
    Abraços,
    Obrigado,
    Marciano Vasques

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  3. Em seu texto você abordou muitas coisas, falou da não valorização do escritor no país. Falou de Paulo Freire, de educação. De cultura e alienação. Mas nada foi tão bem falado, nem tão bonito, como o trecho em que você falou de Jorge Amado e sua prosa, de "seu amor pelas coisas da terra".
    Seus livros sempre me emocionaram muito, li poucos, confesso, mas li muitas vezes os poucos que li. Cheguei a reler "Gato Malhado e Andorinhá Sinhá" no dia seguinte ao terminar de ler pela primeira vez, e ainda reler novamente.
    Dos livros de Amado que li, três me marcaram muito. Releio Jubiabá anualmente já há alguns anos. Sofri com Lívia e por Guma quando terminei de ler o "Mar Morto". E chorei ao contar paras as minhas filhas a história do Gato que prefere a morte a viver sem sua andorinha .
    Acho que falei tudo isso porque seu texto deve ter me inspirado (risos). As palavras com as quais comecei a "rascunhar" esse comentário serão as que usarei para terminá-lo:
    Parabéns pelo seu ótimo artigo!
    Bjo,
    Dan

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  4. Daniela, que alegria tê-la aqui em CASA AZUL DA LITERATURA!, e com seu comentário tão importante para mim.
    Isso que você faz, de ler muitas vezes o mesmo livro, é também um hábito meu, que, aliás, por coincidência, li também poucos livros de Jorge Amado, e todos me emocionaram. E um livro é mesmo para ser lido várias vezes, Jubiabá é lindo, é um livro que todos os brasileiros deveriam ler, e já está na hora de eu o ler novamente.
    Fico feliz ao saber que chorou ao ler para as suas filhas "Gato Malhado e Andorinha Sinhá", um dos privilégios da nossa literatura, que, como "Alice no país das Maravilhas" foi escrito num caderno para ser dado de presente.
    Obrigado pela visita e pelo comentário, beijos, Marciano Vasques

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