domingo, 11 de julho de 2010

SAPOS, FLORESTAS E PÁSSAROS





- "Rospo! Veja aquele pássaro"- apontou a Sapabela para a ave que alto voava.
- Quase não consigo ver, Sapabela...
- Pássaro é assim mesmo: quanto mais alto voa, mais pequeno aos nossos olhos fica...
- Essa ideia é antiga. Eu tenho outra...
- Qual?
- Quando algo está perto, não vemos totalmente a sua beleza. Conosco também é assim: se estamos muito próximos, o outro não vê o que de belo e grandioso dentro de nós temos.
- Que papo é esse, meu querido?
- Verdade! É preciso uma distância para que o outro comece a ver o que em você há de bom...
- Estou entendendo: se você olha a floresta bem de perto, enxerga com nitidez os insetos, os carrapatos, as aranhas e os vermes que rastejam. 
- Para ver a sua beleza, você precisa se posicionar num raio de distância adequado. Quanto mais longe, mais se vê a beleza florestal. Mas o "longe" não pode exagerar. Um rosto é também assim: de perto se vê os cravos, as espinhas...Porém se a floresta ficar muito longe, some das vistas. Por isso, a distância tem que ser ideal...
- Nem sabia que existia distância ideal.
- Para tudo, minha amiga, para tudo...
- É mesmo! O pássaro desapareceu.
- Ele continuou a voar e ficou longe dos que não podem fazê-lo...
- Coisa complicada, Rospo. Quer dizer que se o voo for muito alto, a visão alheia não alcança. Às vezes, fica-se invisível para os olhos. É isso?
- Estou querendo dizer que temos que ser pássaros e florestas ao mesmo tempo.
- Sei. Manter a distância...
- Sim, uma distância saudável.  Mas o importante mesmo é seguirmos a nossa natureza de voo, como os pássaros, sem nos preocuparmos com a visão dos que não construíram as próprias asas...
- Construir asas? Loucura, Rospo!
- É, minha querida, asas não brotam espontaneamente.
- Rospo, de longe não se consegue ver as cores dos olhos de um rosto.
- Há?

HISTÓRIAS DO ROSPO 2010 - 127
Marciano Vasques
ARTE: Daniela Vasques


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