domingo, 10 de julho de 2011

SAPABELA ENROLANDO

—Você disse que só as coisas boas duram, Rospo.
—Só o que é bom sobrevive ao tempo, Sapabela.
—Mas o casamento da minha amiga Colibrã ainda dura, Rospo!
—Que coisa feia, Sapabela!
—Hoje é domingo...
—Pede cachimbo...
—Rospo, sei que você não resiste a uma parlenda, mas não é isso que eu ia dizer, eu queria dizer que hoje é domingo, então é dia de brincadeiras...
—Tem razão. Mas vamos deixar o casamento da sua amiga em paz. É curioso que o casamento tenha sido mantido durante séculos e séculos por dois pilares que são os elementos econômicos imperativos.
—Imperativos? Essa palavra me lembrou Kant...
—Você leu Kant?
—Li, mas não entendi...
—Está brincando!
—Fale baixo, estou sim brincando. Se eu disser que entendi, é capaz de ele voltar do além e modificar tudo o que escreveu...
—Sapabela, hoje você está atacada. Mas, com essa brincadeira, me fez lembrar de algo. O filósofo se torna mais complicado quando você lê um crítico, em vez de ler a obra original.
—Essa mania acadêmica de complicar não seria uma forma de se proteger do senso comum, do leitor simples do povo? Assim, você encerra a Filosofia entre muros e...
—Sapabela, você está impossível hoje! Está desviando o assunto. Falava do casamento, lembra?
—É mesmo! Eu não tenho culpa de ser feliz, mas tenho que falar baixo isso...
—Por que, minha amiga?
—Sei lá, posso ser acusada de ser feliz...
—Nossa!
—Às vezes a condenação é o isolamento...
—Fale do casamento, por favor!
—Ah, sim, os tais pilares...
—Então?
—São os imperativos econômicos: o sapo trabalhando para manter o sustento e a sapa cuidando do lar, cuidando da casa, dos filhos... Virando "patroa".
—Sei, tornando-se rainha na escravidão.
—Pare com isso, Rospo! Hoje o papo é divertido, hoje é domingo...
—Pede ...
—Já sei, pede cachimbo...
—Não! Eu ia dizer, pede poesia, pede conversa, pede música, pede dança, pede alegria, pede festa, pede encontros, pede amizades...
—Olhe o bicho querendo estender o sábado.
—Esse papo me fez pensar na sapa... Na situação da sapa...
—Papa rimaria mais com sapa, mas ficaria esquisito, não é? Você olhar para a papa e pensar na sapa...
—Do que está falando, Sapabela?
—Meu pensamento às vezes é um trava-língua.
—Eu sei, mas precisa concluir o assunto do casamento.
—Ora, li certa vez que você não é obrigado a ler um livro até o fim, se está a fim de se espreguiçar... Pode deixar para terminar a leitura noutro dia qualquer, ou, se não quiser, nem ler o final deverá... Sendo assim, esse papo pode continuar em outra história.... Pastéis assados?
—Vamos lá, já que você me enrolou, vamos aos pastéis... E depois, que carrossel feliz é a vida quando se tem alguém pra conversar...

MARCIANO VASQUES




HISTÓRIAS DO ROSPO — 634
Rospo está aos sábados em

2 comentários:

  1. Casamento, domingo, Kant, Filosofia,cachimbo, trava-lingua,encontros, amizades, conversas, livros, poesia, música, dança, alegria, pastéis...Carrocel de sonhos a girar no tempo!
    Luz
    Ana

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  2. Acolhedoras estas conversas simples e simpáticas dos já meus amigos sapinhos. Dou por mim a sorrir entre eles.

    Um abraço
    oa.s

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