domingo, 13 de novembro de 2011

PAPINHO DE CARTOLA?

—Sapabela?
—Chamou, querido?
—Chamei, quer dizer, queria falar com você.
—Estou aqui, sou sua amiga. Diga, Rospo.
—Você é minha amiga preciosa.
—Isso me deixa feliz. É bom ser uma amiga preciosa quando se poderia ser...

—O que está dizendo? Esse carro buzinando atrapalha tudo. Pode repetir?
—Sapa não é muito chegada em repetir.
—Mas estava dizendo algo importante.
—Escute aqui, Rospo! Eu, por acaso, digo algo que não seja importante?
—Sapabela, não é isso! É que talvez as coisas variem em grau de importância.
—Muito bem. Eu estava a dizer que satisfaz ser uma amiga preciosa. Toda sapa adora isso.
—Meio irônico ou é impressão minha?
—Estou brincando, Rospo, claro que amo ser sua amiga preciosa.
—Gato e rato.
—O que disse?
—Que deveríamos tomar um sorvete. Vamos?
—Já indo. E então?
—Então, o quê?
—O vestidinho.
—Lindo, Sapabela! E tem algo que preciso dizer.
—Você só diz o que é preciso.
—Seu perfume hoje está de luar.
—Obrigada! Mas, de luar?
—É, perfume de "bolero de Ravel", de lua de enlaçar...
—Rospo, promete algo?
—Entre nós isso não existe. Prometer é para os inseguros.
—Tem razão. Então, me diga algo.
—Sim?
—Nunca me deixará?
—Naturalmente que não. Somos amigos. Mas você sabe...
—O que eu sei?
—Pode surgir um namorado ou uma sapa e então, você sabe, geralmente as amizades se modificam...
—Isso é mais uma questão da sapa, e mais na adolescência, que tem aqueles sapinhos...
—Sapinhos?
—Eu quis dizer: os sapos ainda não estão amadurecidos, e aí tem aquela história de proibir amizades, não é o nosso caso. Seremos amigos, mesmo que surjam os intrusos.
—Intrusos?
—É o modo de falar. Nós que somos intrusos, estranhos ao luar...
—Sinatra!
—Isso! Sabe, Rospo: Tem sapo que andou escrevendo que Sapas e Sapos não podem ser amigos. Que fatalmente serão namorantes...
—Iupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii !
—Pare de escândalo! Eu não disse que concordo com esses articulistas. Sapo e Sapas podem sim ser amigos.
— É que tem uma coisa inevitável...
—O que?
—Sempre haverá entre os sapos e as sapas a natural força de atração.
—E daí?
—Nada. Daí que quando a amizade é prevalecente, essa força de atração, natural, é domesticada, é controlada.
—E isso é bom, não é?
—Nunca considerei perda imensa uma coisa boa.
—Sei não, Rospo, esse seu papo tá meio assim papinho de cartola. Vamos ao sorvete?
—Vamos, mas obrigado pelo perfume, e pelo vestidinho. E obrigado pela sua conversa sempre tão generosa.
—Sou sempre generosa.
—É????????????????? Iupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
—Rospo! Que coisa! Não posso nem falar nada!


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 700
Marciano Vasques

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