domingo, 8 de janeiro de 2012

NA PRAIA VENDENDO QUEBRA-QUEIXA.

—Rospo, que faz aqui na praia?
—Vendendo quebra-queixa.
—Não é quebra-queixa, amigo! É quebra-queixo.
—Engano seu, Sapabela.
—Ula lá! Ula lá!
—Que foi essa alegria, amiga?
—O primeiro engano do ano! Isso é motivo para comemorar.
—É melhor deixar...
—Rospo, tem certeza de que é quebra-queixa?
—Claro! "Com acúcar e com afeto".
—Rospo, quer que eu diga o que penso?
—Sempre!
—O que você quer é " ficar olhando as saias de quem vive pelas praias".
—Andou visitando o Chico Buarque?
—Você que falou do açúcar e do afeto, Rospo, e é revisitando. Faço isso frequentemente. Você sabe: mecanismo de defesa interior. Faz bem para a oxigenação mental, para a alma, nos deixa mais purificado e nos renova as forças diante da aspereza ou da esterilidade do cotidiano.
—Também faço isso. Hoje, mais do que antes,  é uma necessidade...
—No plano individual. Como disse um outro compositor: "Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é". Mas conte esse "papinho de cartola" de estar vendendo quebra-queixa.
—Pois é.
—Seu 'Pois é" eu conheço. Seja específico, objetivo. Sapabela quer claridade, clareira, clarice.
—Tá cheio de sapo que só vive se queixando. Então, vendo quebra-queixa, que é para modificar as atitudes mentais.
—Tá maluco, é? Quem vive a se queixar vai continuar se queixando.... Serão 365 dias de queixas. Não tem como estancar, interromper isso.
—O segundo engano do ano, Sapabela.
—Yupiiii! Desculpe. Isso é você: Ula lá! Ula lá! Ula lá!
—Você é muito engraçadinha, mas quero explicar. Veja só: Em vez de ficar se queixando, que afinal é um hábito cultural, cada um deveria ir à luta, tomar um gole de atitude e tentar modificar a situação. Sabe que certas coisas queixosas só dependem da atitude individual de cada qual, outras clamam por ações coletivas. Situações de opressão, discriminação, moradia, injustiças: tudo isso, minha linda amiga, são coisas que têm o requisito essencial da atitude, no caso, coletiva. Então, certas queixas precisam ser transformadas em atitudes individuais e outras em coletivas. Ou seja: menos queixa,  mais ações.

—Parece um professor falando.
—E você uma menina serelepe.
—Ganhei o dia!
—É?
—Sim, falou Serelepe! Eu prometi...
—Prometeu para quem?
—Só prometo para mim.
—Pois diga então.
—Prometi que sempre que pronunciasse a palavra serelepe, eu me lembraria da Tatiana Belinky, embora para você, meu caro, toda palavra é em si serelepe.
—Muito bem! Vamos comigo, Sapabela?
—Ora, meu amigo, já estive no semáforo entregando panfleto de lançamento do seu primeiro livro, então, claro que vou acompanhá-lo na venda de quebra-queixa. Não quero também uma vida e uma sociedade queixosa. Quero ação. 
—Bravo, Sapabela! E veja que  azul de praia esplendoroso.
—Olhe só para o mar, Rospo, para as ondas...
—Que tem, Sapabela? A praia está praticamente vazia!
—Está bem, cuidado para não esbarrar em alguém caso se distraia com alguma sapa.
—Nem ligo Sapabela, só tenho olhos para....
—Rospo! Não se popularize tanto.
—Só tenho olhos para o azul, para o céu, para a poesia.
—Está bem, está bem, merece um sorvete. Vamos? Termine de vender logo as suas quebra-queixas!
—Sapabela. Que ideia boa! Sorvete na praia. Depois continuo vendendo. Por enquanto, quem quiser, que continue se queixando.

HISTÓRIAS DO ROSPO 2012    — 760
Marciano Vasques

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