quinta-feira, 7 de março de 2013

PIQUES E PIQUES


—Rospo, por onde anda? Que tal falar desses piques de afastamento?
—Afastamento é coisa impensável, Sapabela. Esses tais piques são apenas fragmentos necessários das andanças...
—Tem viajado?
—Andança interior também vale, minha belinha.
—Que bonito! Mas eu adoro mesmo aquele "Nega"... É demais, fico toda envaidecida quando essa manifestação amorosa oriunda de nossa oralidade infinitamente rica...Mas fale, algo está acontecendo?
—Às vezes, Sapabela, é preciso acionar o eixo, no mergulho essencial...
—Compreendo, e soube que anda meio chateado? É verdade?
—Não, não, em absoluto. Você sabe que somos fontes de onde jorra a alegria... E sua amizade é o pique do arrebatamento das coisas essenciais e ludicamente floridas da vida... Com você ao meu lado, em nossas conversas trançadas, a alegria está sempre presente. A conversa é uma das mais expressivas formas de felicidade do sapo, parodiando o Borges, que disse algo semelhante se referindo ao livro...Para ele o livro sempre existirá em sua forma de objeto de culto, de amor... Curioso, não é? Ele imaginava a biblioteca infinita, e, você sabe, a Internet...
—Está desviando o assunto, Rospo! Fale mais dessa suposta não chateação.
—Ora, Sapabela, bem sabe que neste mundo o que mais encontramos são as oferendas de sentimentos entristecidos, banhados no polimento do ciúme e da inveja...
—Você é um "positivista", acredita no "Poder do Pensamento Positivo"?
—Sapabela, nem positivista nem Positivista. Acredito, entretanto, que  "É sim preciso ordem para o progresso interior, isto é, harmonia para que a alma possa destravar seus empecilhos"...
—Essas oferendas  vêm dos inimigos?
—Nem pensar, Sapabela! Acreditar que um inimigo possa nos decepcionar é atribuir muita força a ele. Isso é privilégio de amigo. Só o amigo faz isso. Ou seja, só ele tem o dom, o poder, de nos oferecer um tapete, o tal ardilosamente tecido tapete, que pode ser habilmente puxado pela traição.
—Mas então não é amigo, Rospo!
—Nem é inimigo. É uma fôrma de fazer capeta que alguns abrigam na fornalha de suas almas. Porém, verdadeiramente, o amigo está onde qualquer infecção da amizade possa penetrar...
—Infecção da amizade? Roubou de Espinosa esse termo?
—Você está afiada hoje, nega.
—Uau Uau Uau! Viva! Eu era feliz e não sabia...
—Sapabela, considero muito profundo essa sua última frase. Complexidade pura.
—Prossiga, Rospo.
—Infecção da amizade é causada por descuidos, desapegos, nem precisa desaforamentos.   Basta uma faísca assim desse tamanhinho de descaso...
—Que faísca, Rospo? Isso é um fiapinho, uma doidice só, um descuido... Faísca lampeja, por menor que seja, atiça...
—Pois é, querida...
—Você nunca me convidou para almoçar...
—Que tal...
—Aceito!
—Em meia hora nos encontraremos...
—Ótimo, é o que eu precisava para me arrumar. Um minuto.
—Prefere dois minutos? Ou seja, Uma hora?
—Não seja maldoso, Rospo. Além do mais, você bem sabe que...
—Vale a pena esperar.
—Então daqui a pouco. Eu adoro isso. Minhas roupas não combinam. Você sabe. Mas eu adoro me vestir de Sapabela. E aqui mando um beijo para a Violeta, e outro para a Lady Garça...
—A Lady eu conheço, mas quem é a Violeta?...
—A protagonista de um seriado juvenil argentino, da Disney...
—Certo, certo, certo. Vá querida, que já estou faminto.
—Vá pensando só no almoço, bonitinho.
—Mas estou  faminto de palavras, de conversas, de letras...
—Pois é, Rospo, pois é.  Bem, lá vou eu.
—Yupiiii!


ROSPO 2013 — 860
Marciano Vasques

Um comentário:

  1. Eu também me afastei...mas estou aqui! É que o caminho é muito comprido e ás vezes, me perco nas voltas do tempo...
    A Casa Azul...continua de azul brilhante.
    Beijo
    Graça

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