quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

ACUSADOS DE POESIA

— Rospo, eu te acuso.
— Do que afinal me acusa, Sapabela?
— Eu te acuso de Poesia, de ser poeta...
— Serei condenado, Sapabela?
— Sim, a vagar na ventania que agita a sonolência de concreto da cidade... Estarás no centro de todas as dores, irás escorrer e transbordar em todos os prantos, e sua alma plangente dançará o seu bailado de promessas e ternuras em todos os epicentros, serás a flor que cativará as almas desatentas...
— Tudo isso, Sapabela?
— E muito mais, Rospo.
— Tem mais?
— Sim, serás a força inesgotável, o insondável mistério no centro do picadeiro universal. Irás incomodar e ao mesmo tempo causar uma explosiva alegria, cuja força de luzes hemorrágicas não poderá jamais ser contida...
— Sapabela, por que decidiu me acusar de ser poeta?
— Pelo fato de ser sua amiga, e para isso servem os amigos...
— Fale mais...
— Assim estás me explorando, Rospo...
— Uma coisinha a mais... Uma frase...
— Rospo, o poeta é um efeito mágico que descortina o amanhecer, que dissipa o nublar dos olhos que se acostumaram com o desbotamento próprio do cotidiano... Eu te acuso de implantar riachos de águas cristalinas onde reinava a poluição... E te condeno a prosseguir enfeitando a minha alma com suas bandeirinhas multicoloridas, seus versos transparentes...
— Sapabela, eu a acuso...
— Eu? De que posso ser acusada?
— De ser uma inflorescência ambulante...
— Que lindo, Rospo! Bem, vamos então comemorar as nossas condenações... Quer um sorvete?
— Quero! Sabor Quintana...
— Eu quero Drummond...
— Eu quero sabor Cecília...
— Eu quero sabor Mario de Andrade...
— Rospo, pelo que eu sei, tem sorvete de sobra...
— Sapabela, você me faz rir...
— Erga o seu riso, Rospo, e o espalhe no ar... A poesia agradece...


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 - 399
Marciano Vasques
Leia em CIANO

3 comentários:

  1. "E la nos assombra, nos provoca...Não podemos ficar impunes, passivos diante dessa grandeza, dessa imensidão"
    "Somos intensos e nem nos damos conta"
    Pois é amigo, me emocionei, Você ofertando e eu percebendo, minha alma está sendo enfeitada com tuas bandeirinhas, só te agradeço pela beleza..
    Muita Luz
    Ana Coeli

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  2. Quem tem que agradecer sou eu, e muito, pelos presentes que a vida me oferta: amizades que são como cachos de luzes,
    Abraços e beijos do Rospo, da Sapabela, e eu, claro!
    Marciano Vasques

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  3. Foi com grande alegria q deparei-me com seu blog á parti da lista de blogs de uma amiga, amei o texto e que condenação mais suave:
    "Acusados de poesia", as personagens Rospo e Sapabela muito me alegraram.

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