Rospo rebusca rabiscos na alma para compreender o que o teria entristecido, e ao se dar conta de que entre tecidos o coração se renova, tenta se erguer, machucado, como se fosse uma sequela, atolado numa incicatrizável memória do que poderia ter sido... quando encontra a velha amiga Sapabela.
—Oi, Rospo?
—Sapabela! Hoje é sábado. Poderíamos tomar um sorvete...
—Não falou do meu vestidinho!...
—É mesmo! Mas ele é lindo.
—Assim não vale. Bem, vamos lá. Falando em ironia mordaz...
—Quem falou?
—Sarcasmo é fingir orgasmo...
—Sapabela! Tem criança que lê as minhas histórias!
—Ora, Rospo, parece pasmo!
—Sim, sinto-me, de qualquer forma, espantado... sempre, não é?
—O que o está perturbando, meu amigo? Se procurar no Dicionário da vida, lerá que Sapabela significa "Apoio"...
—Eu sei, minha flor. Mas está tudo bem. Por que disse aquela coisa lá do sarcasmo?...
—Sabe, Rospo, muitas sapas vivem com seus fantasmas, algumas fingem sentir até prazer no amor...
—Isso existe ainda?
—Aos montes. Para mim é algo estranho alguém fingir que sente algo que não está sentindo... Não tem sentido.
—Mas porque essas sapas sentem tais coisas, como diz?...
—Para agradar ao parceiro...
— Meu Deus! Não sabia que sapas se anulavam tanto...
—Rospo, às vezes o "amor" tira a alegria e o brilho da sapa... E ela perde as cores em nome desse amor. Isso sempre acontece quando uma sapa escolhe o sapo errado...
—Falou bem, é a sapa que escolhe.
—É mais ou menos isso, pois numa multidão, quando dois se encontram e se aproximam, é uma sintonia que não se explica nem em conversas nem em mil verbetes...
—Mas diz que sapas sofrem, perdem as cores, se entristecem, e tudo o mais, em nome do tal "amor", quando participam da escolha errada...
—Isso! Quantas sapas sofrem! Perdem aquela vivacidade que tinham... E isso acontece muitas vezes no primeiro namoro. Sapas são feitas para o amor, mas jamais deveriam, cada qual, perder o viço, o brilho dos seus olhos...
—Mas sapos sofrem... também...
—Mas são sofrimentos diferentes... Dificilmente um sapo é oprimido, é escravizado...
—Entendi, então, a solução é renunciar ao amor, extirpar do planeta humano esse sentimento...
—Pare de provocar. Sabe que a solução é outra, é educar o amor, cada um teria que fazer, pelo menos de forma intensiva, um curso em sua vida, para mudar o próprio curso dela, e aprender que amor que escraviza, que impede a liberdade intelectual do outro, não é amor. Amor que proibe é qualquer outra coisa... Amor que mostra poder de um sobre o outro não é de fato tal sentimento...
—Entendi, o amor está precisando de uma revolução...
—Exatamente, meu caro amigo. Mas isso, essa conversa aqui deveria ser uma crônica....
—Às vezes crônicas são muito doloridas...
—Rospo, meu lindo, o sorvete nos espera.
— Então vamos. Afinal, é sábado!
—Sábado, que te quero tanto.
—É um dia como outro qualquer, Sapabela.
—Sei que está brincando, Rospo... Pois bem sabe que jamais um dia é igual ao outro.
—Mas está incompleta a conversa sobre essa coisa que você levantou de que uma sapa finge para agradar ao parceiro...
—Não está incompleta, Rospo!
—Não?
—Não?
—Não! É que as leitoras e os leitores bons companheiros irão continuar o assunto...
—Acredita nisso?
—Aposto com certeza.
—Eu também.
—Então, já deu empate.
HISTÓRIAS DO ROSPO — 670
Marciano Vasques
Marciano,um assunto profundo tratado de forma bem leve!Gostei muito da reflexão e realmente há muitas mulheres que se anulam por seus homens,mesmo nos dias de hoje, o que não deveria acontecer! É preciso saber o seu próprio valor, se amar primeiro para poder amar o outro!Parabéns pelo belo texto!Bjs e bom final de semana!
ResponderExcluirFingir é trair a si mesmo e ao outro, uma maneira cruel de controle e submissão.Texto para refletir, maravilhoso como sempre!
ResponderExcluirLuz!
Ana