segunda-feira, 7 de novembro de 2011

REENCONTRO NUMA PRAÇA

—Sapabela! Que vontade de aplaudir!
—Aplaudir o que, Rospo?
—A sua chegada, o nosso  encontro. Isso merece aplauso.
—Se começar a aplaudir dirão que é maluco,  a praça está repleta.
—Aplaudo então com o olhar, olhando você, seu vestidinho branco. É a primeira vez que usa branco. Deve ter algum significado.
—Não, meu querido. Apenas considerei o vestido muito bonito, e quis usá-lo, mas não deve estar combinando com a fita nem com os brincos. Sou assim mesma, já sabe. Não combino nada. E quando vou organizar, acabo desorganizando tudo. Meio atrapalhadinha, não é?
—O  papo do vestidinho não me convenceu. Para a sapa uma cor jamais será em vão. Se está de branco, em vez de azul, algo quer dizer. Talvez seja uma forma de começar o seu enluarar-se.
—Rospo! Um sapo tem de observar tudo! Não reparou o azul na fita?
—Vi, Sapabela. Mas o branco está predominando. Deixe-me apertar a sua mão.
—Estava demorando, Rospo, meu doce amigo.
—Sapabela! Que quentura! Isso é quentura de querer.
—Não estou querendo nada que sua mente ligeira esteja supondo.
—Não supus nada. Apenas que isso não é quentura de ficar em casa.
—Nisso tem razão, meu querido. Abra os braços! Vamos ao teatro. Cinema.
—Agora não dá mais. Vamos ficar aqui na praça.
—Rospo?
—Sim?
—Não vai me convidar para um sorvete?
—Vamos?
—Já indo! Adoro tomar sorvete na calçada.
—Eu me contento com a calçada.
—Que está querendo dizer?
—É que lembro das janelas...
—Tomar sorvete na praça, na calçada. Isso é um privilégio. No teatro, que infelizmente não podemos ir hoje, as coisas são faladas no palco. E aqui, no sorvete nosso, são faladas de olhar para olhar. Isso não tem preço.
—Sapabela. Felizes os que podem viver um pouco que seja da noite. Assim somos nós.
—Posso dizer algo?
—Sapabela. Se tem uma coisa proibida entre nós é pedir permissão. Diga!
—Você é desconcertante.
—Talvez por isso ainda não fomos a um concerto.
—Rospo, veja a lua!
—Ela é um satélite, sabemos disso, mas é mais do que um satélite.
—O que é a lua então?
—A mais doce testemunha dos amores confessados, e também dos sorvetes nas noites de olhares que aplaudem. Sapabela. Obrigado pelo lindo vestidinho branco.
—Pus porque eu gostei, Rospo.
—Eu sei, mas eu gostei porque tive o privilégio de ver, e por isso agradeço, que agradecer é tecer amavelmente.
—Rospo, não se afaste jamais. Meu amigo adorável.
—Sapabela. Sou o sapo mais sortudo e feliz do mundo.
—É?
—Religiões, mitologias  e crenças dizem que anjos existem...
—E daí?
—Descobri que  um deles adora sorvete.
—Está muito sensível, Rospo. Parece que enfeitou a alma com boleros.
—"Ela sempre acerta!"...


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 696
Marciano Vasques

2 comentários:

  1. A Sapabela que repare que o Rospo está bonito demais, uma história bonita. Um abraço, Yayá.

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  2. Falar de olhar para olhar é algo que sempre será mágico, esse verdadeira essencia do sentir, da amizade, o conhecer o outro por aquilo que diz e por tudo aquilo que silencia.

    Adoro estes sapinhos.

    um abraço Marciano Vasques.
    oa.s

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