sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

A PRESENÇA DO CUIDADO

—Rospo! Cuidado!
—Obrigado, Sapabela. Estava mesmo distraído ao celular. Sempre assim, quando ligo para você.
—Vinha um carro. Tem que ser mais atencioso para com você mesmo. Ligava para mim?
—Sim, mas agora me fez lembrar de algo: o melhor amor é o cuidado.
—Cuidado?
—Da mesma forma que um jardim, o amor, assim como todas as coisas e os sentimentos, precisa ser cuidado. O amor cuidado é o melhor, viceja a cada dia, frutifica, fica melhor, cresce, prolonga-se, e nós, partidários do pró-alongar, bem precisamos de um assim, cuidado.
—Todos os sentimentos? Mas, e a raiva, o ódio, a inveja?
—Quem no peito abriga esses maléficos sentimentos, também do Cuidado precisa, para não fazer besteira. O ideal é que o sapo raivoso, odiento, ou invejoso, apenas a si mesmo prejudique.
—O amor em si já nasce do cuidado.
—De fato,  é filho do Cuidado com a Tolerância. Entretanto devemos dele cuidar, alimentar o cuidado. Que é faminto de ser.  É de fato o melhor investimento que podemos em nossa vida fazer.
—Refere-se ao amor entre o sapo e uma sapa?
—É o principal. O amor básico.
—Mas ele não é uma invenção cultural?
—Sabemos que sim, e ficamos felizes ao ver a evolução do sapo. Agora, só precisamos aperfeiçoar esse amor inventado.
—Aperfeiçoar?
—Sim, naturalmente. Levará gerações, mas pode começar por nós.
 Amor inspira cuidado, pois do cuidado nasceu.
—Não sabia que o amor de uma sapo e uma sapa é o amor básico.
—Sim, Sapabela. Pois é dele, inclusive, que nasce o respeito e a tolerância, seu simbolismo materno. Tal amor enriquece a vida e faz sorrir, transforma o mais brutal sapo num razoável sapo.
—Rospo, parece-me uma visão muito onírica,  romantizada da vida, que é cruel e real.
—Isso é bobagem, de certa forma. A crueldade da vida é edificada pela normatização da vulgaridade, da agressividade.
—Entendi.
—Rápido assim?
—Sapabela, meu!
—Faz tempo não falava isso. Já estava com saudades desse gingar da alma.
—Sabe, amigo: Vou na cadência da vida. Num mundo  regado pela burrice do sapo, que insiste na cegueira diante das  simples e belas coisas da vida, que posso fazer? Se nada posso para mudar a tolice do mundo, pelo menos cá estou, integralmente aberta...
—Iupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
—Pare de ser bobo e deixe-me terminar! Integralmente aberta de coração e mente para a plenitude da vida em suas possibilidades de felicidade. Esse caleidoscópio que tanto me atiça.
—Sapabela, então, a partir de hoje, seremos aquilo que o amor requer: "Cuidado!".
—Agora vamos procurar por ele.
—Ele quem?
—O amor!
—O amor não se procura. Ele nos encontra.
—Encantra?
—Sapinha esperta.
—Rospo?
—Sim?
—Leva eu?
—Levo!
—Calma! Deixe-me terminar: Leva-me para uma sorveteria.
—Não me faça rir. Não a levarei, pois é você que me leva.
—Assim nos levamos. Na amizade já estamos de bem com o "Cuidado".

HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 717
Marciano Vasques

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