SAPABELA, LUA E SOL, FELIZ
—Sapabela,
está tão feliz! Por acaso, está matando a saudade de algo?
—Eu?
Não mato nem formiga... Por acaso, iria matar a saudade? Não
cometeria esse crime. Saudade, que venha, quero vivê-la
intensamente.
—Se
pudéssemos...
—Se
pudéssemos o quê, Rospo?
—Dançar
na praça. Ao luar, e ver outros sapos e sapas dançando...
—Quem
sabe o mundo ainda será assim...
—Mas
conte-me o que a está deixando tão feliz...
—Rospo,
assim como você é cigarra e formiga, isto é, canta, quer dizer,
anuncia a literatura e a poesia do mundo, então, canta e trabalha
incessantemente pelo canto...
—Sim?
—Sou
lunar e ensolarada ao mesmo tempo. Sou lunar porque sou fêmea, sou a
portadora dos mistérios, mas sou o sol que gira em mim...
—Gosto
quando fala de você...
—Adoro
me vestir, Rospo, com as cores que gosto... Que me importa se minhas
roupas não combinam? Sou vaidosa e isso me deixa tão feliz...
Jamais recuso uma conversa... Se um dia recusar uma conversa, pode
acreditar, estarei tão doente que nem mais estarei aqui...
—Não
fale isso, querida.
—Adoro
gargalhadas, confio nos sapos que quando falam olham nos olhos... Os
olhos são como a janelinha do trem... No caso, as paisagens estão
dentro do outro...
—Que
mais? Que mais?
—Tenho
consciência de que a boca que diz palavras de amor, e de luta pelas
liberdades, é a mesma que cochicha no ouvido do ser amado as juras
mais sinceras... A boca pela qual entra o alimento em nosso corpo é
a mesma que alimenta a alma da multidão quando canta ou quando
discursa palavras de amor...
—E
o maior atributo da boca é o beijo...
—Sim,
no céu da boca, nessa catacrese maravilhosa, estão as estrelas mais
preciosas, com a luz atiçada pelos beijos de amor...
—Sapabela,
estou impressionado, parece até que está adivinhando que a
convidaria para uma taça de bebida de uva...
—Estou
feliz! E a medida da felicidade cabe nos verbos...
—E
no olhar, no silêncio, num gesto delicado... Num sorriso...
—Enfeites
do verbo, Rospo. Enfeites da palavra.
—Sapabela!
—Está
pensando o quê, meu amigo? Quando o navio aponta no horizonte, já
estremeço de festejos na minha alma pura de cais.
—Duas
taças, por favor.
—E
um licorzinho de anis, só para celebrar...
—Nunca
vi alguém celebrar o vinho que virá...
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 806
Marciano Vasques
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