sábado, 22 de setembro de 2012

SÁBADO DE MARGARIDAS


SÁBADO COM MARGARIDAS


——Yupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
——Que alegria mais alegre, Rospo!
——É sábado, amiga!
——Já sabadofiquei-me, estou enlaçada pelo sábado. Pura alegria! Sou alma de cigana em coração de circo. Sou ramalhete de solfejo, de almejar...Veja-me.
——Nem precisa pedir, meu bem. Tudo está mais do que se quer... Seu esmalte, lilás, seu vestidinho. Sábado é tudo de bom. Vamos?
——Vamos! Mas, antes da Padaria Rubi, vamos passar na Praça Luar Azul.
——Hoje é sábado, isso faz lembrar moqueca de peixe...
——Moqueca de peixe onde?
——Em Luanda?
——Em Lisboa?
——Viva que a vida anda. Viva que ela é boa!
——A vida não tem jeito, que me venham todos os portos, todas a neblinas, todos os seguros cais, todos os poemas, estilhaço-me no alto da lua, sou navegante de todos os quereres...
——Uau! Uau! Uau! Quem vai lá, querida amiga?
——Vai galopando, por acaso? Na alvorada, no ocaso?
——Não! Se rastejando, de forma insinuante, ondulada, gosmenta...
——É a inveja. Tchau, bobona! Sapinhas, nem façam careta quando ela estiver passando. Deixe que ela vire fumaça, poeira...
——Feliz me quero. Vamos que a sedenta pede licor de anis.
——Sedenta?
——A velha boca sedenta da água do riacho da poesia... Sedenta de poemas, sedenta de palavras azuis... de beijos, de realejos...
——Rospo, eu amo...
——Eu sempre soube, está em cada gesto seu...
——Rospo, deixe-me completar. Sou puro amor. Só acredito nisso. Amar. Nada além disso. Se não tiver amor, não vale. E quando se sentir desamparado, pense em Amparo. E quando se sentir num desafeto, pense no afeto... Ou melhor, aja no afeto.
——Amo uma margarida.
——Do que fala, meu anjo encapetado?...
——Encapetado? Uau! Desnorteado jamais. Diga...
——Diga você, quero saber dessa margarida.
——Sim, eu a vi pela primeira vez num campo orvalhado de um sábado, e não estava só, era um campo repleto de margaridas, todas brancas com aquele miolo de girassol, bem pequeno, para onde isso foi, minha amiga?
——Em outros lugares, Rospo, pode até procurar no lugar mais certo, em você...
——De uma coisa esteja certa, minha ciganinha, eu a guardo em mim, aquela aparentemente frágil e singela margarida, pois sua fragilidade é pura ilusão.
——Fale disso, Rospo. Quero saber, pois a margarida para mim é frágil como a miosótis...
——Puríssimo engano, minha amiga. Nem um nem outro é frágil. E a fortaleza da margarida está em mim, em cada sapo e em cada sapa que um dia na infância a viu, e diante dela se deteve pelo menos por uns segundos... Que são os instantes preciosos da vida... Quem viu a margarida com os “Olhos de Ver” de Tatiana Belinky, quem a viu, a levou vida fora...
——Que bonito, mais bonito só Cesária Évora!
——A boniteza é apenas uma opção do olhar que não desiste... Você já desistiu de algo, Sapabela?
——Rospo, explique-me esse verbo...
——Deixe pra lá. Sapabela, hoje é sábado! Paz na Terra aos sapos que compreenderam a imensa força da margarida na edificação da alma de um sapo.
——Sim, uma flor não é apenas uma flor, mesmo que esteja num charco. Uma flor é muito mais do que apenas ela.

HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 825
Marciano Vasques

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