TOMANDO A NOITE PARA SI

Sexta-feira, Que lua!, Sapabela na calçada encontra o velho amigo, isso rende conversa pra dedéu.

E ela toma a noite para si, mergulhando com altivez.

—Sou feita de água, Rospo.

—Já sei, chora sempre.

—Sim, adoro chorar, mas é sempre um choro de felicidade, no cinema, até mesmo numa desavença choro a granel, mas bem sabe, nada de chorar num rio de mágoas, já se disse você: “mágoa é a má água”. Mas o que gosto mesmo é da minha gargalhada.

—Fale mais de você, amiga.

—Adoro ser atrapalhada, curto o lilás do meu esmalte, aliás, todos os lilases... Curto da mesma forma o mais profundo romance... E adoro ler, atualmente estou lendo “O Duplo”...

—Dostoiévski?

—O próprio.

—Você é mesmo uma pura alegria... Uma autêntica algazarra da alma.

—Nesses qualificativos você acertou em cheio: Sou em tudo pura e autêntica. Não vejo como as coisas podem de outro modo  ser... Só a autenticidade me interessa... Pirataria da alma não me atiça... Amor terceirizado, anomalias do viver, nada disso me importa...

—Sendo assim...

—Cantar, girar, fazer bolo de cenoura... Não peço desculpas por ser feliz...A maior virtude para mim é a lealdade... E isso se aplica à vida em geral... Lealdade para com os seus sonhos... Isso já rolou numa conversa nossa recentemente...

—Verdade, estávamos indo para a padaria Rubi...

—E você, como está, Rospo?

—Estou já me sabadoficando. Vamos ao cinema? Ou ao teatro? Se bem que já é tarde.

—Tarde? O que é isso, Rospo?

—Deixe para lá. Eu a convido...

—Aceito!

—Nem falei...

—Precisa não. Seja o que for, melhor será com licor de anis.

—Venha, minha alegria de viver.

—Cadê, Rospo? Cadê o Yupiiii?

—Yupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!

—É bom demais da conta.

—Que lua!

—Agora sim... Tudo aos poucos se encaixa.

HISTÓRIAS DO ROSPO 2012    —830
Marciano Vasques