SAPA NA FLORICULTURA, SAPO NA CALÇADA
Uma sapa chamada
Sapabela, que trabalhava como florista, encontrou num ramalhete um
bilhete:
—Se eu a
conhecesse pessoalmente certamente por você me apaixonaria.
—Só é possível
o conhecimento pessoalmente. Conhecer é um grande verbo, talvez o
mais profundo e o mais necessário de todos. É preciso conhecer para
amar. Mas, será que esse “se apaixonaria por você” estará se
referindo ao envolvimento entre um sapo e uma sapa? Ou poderá
significar “Eu me apaixonaria pela delicadeza de ser que você é,
pelas coisas do seu universo, eu me apaixonaria pela amizade que
estaria brotando. Bem, de nada adiantará eu ficar pensando, pois
afinal nem tenho ideia de quem deixou esse bilhete. Nessa
floricultura só trabalham sapas, vou deixar pra lá.
—Então a bela
sapa reparou que na calçada no outro lado da rua, estava um sapo
parado.
—“Estranho,
aquele sapo fica lá todos os dias, às vezes vem da Faculdade do
Largo, às vezes da Praça do Povo... Quem ele estará esperando?
Parece um cigano, um rapaz errante, um astro deslocado do eixo da
translação. Quem será?
À noite, em casa,
liga a TV para assistir ao telejornal. Uma notícia prende a sua
atenção:
—SAPO AFIRMA QUE
VIU UMA FLOR ANDANDO NO LARGO DA FACULDADE. SEGUNDO O SAPO, A FLOR
SAIU DA FLORICULTURA E SUBIU A LADEIRA RUMO AO METRÔ”.
—“Sensacionalismo!
Bem, tenho mais o que fazer”.
—No dia seguinte
lá estava o sapo. Quando a Sapabela passou por ele ouviu um oi
aquecido. Como é educada, mesmo sendo um estranho, respondeu com um
sorriso e apressou o passo. Mas teve que se voltar ao ouvir um
estrondoso Yupiiii!..
—Espere um pouco!
Você se parece com alguém que eu vi ontem na Televisão! O tal da
flor que anda...
—Sou eu mesmo.
—Você é maluco?
—Aceito.
—Aceita o quê,
Sapo?
—O futuro convite
que virá para um chocolate mentalizado...
—Com licença,
que preciso ir, meu horário de entrada já deu. Como adivinhou que
gosto de chocolate mentalizado? Isso não importa. Preciso mesmo ir.
—Sei, as outras
flores não podem esperar.
Já no trabalho,
Sapabela pensa: “Será que foi ele que colocou o bilhete no
ramalhete? Se for, um dia terá que me explicar esse negócio de '
Por você me apaixonaria' Do que estou falando? Não tenho nenhum
interesse em ter amizade com esse sapo pirado”.
Ao entardecer.
—Lá está ele
novamente com uma placa. Entendi, deve ser um desses vendedores, ou
desses sapos que anunciam empregos ou compra de ouro...
Então, ela lê a
placa.
—TRADUTOR DE
BILHETES
—Pronto, é ele
mesmo! Mais um maluco ou algum galanteador, porém confesso que pelo
menos é original.
Ao final do
expediente, passa novamente pelo sapo.
—Com todo o
respeito, mas você não tem nada que fazer?
—Temos.
—Temos? Você é
mesmo maluco! Amanhã é sábado, e a floricultura não abrirá.
Portanto, tchau! Vai ficar aí parado? Eu disse: amanhã é sábado!
—E ainda por
cima, só fala palavra mágica.
—Vou deixá-lo
falando sozinho...Tchau!
Enquanto a Sapabela
sobe a ladeira, no fremir de seu pensamento, uma gangorra.
—Qual será o seu
nome? Pare com isso, Sapabela! Esqueça. Que importa quem seja?
Afinal, não temos nada em comum. Será? Bem, vou ao sábado. Uma
sapa não faz isso, mas a cidade não irá reparar se eu olhar para
trás”.
Ao virar o rosto
para trás ela ouve novamente o incrível Yupiiii!
—“Por que eu
fui fazer isso?”
—Sapa!
—Diga cigana do
realejo. O que quer?...
—Não precisa
pagar pela consulta.
—Que consulta? Do
que está falando?
—Tome. O
periquito retirou para você.
Sapabela lê o
cartãozinho.
—“ÀS VEZES É
GRATIFICANTE OLHAR PARA TRÁS”
—Quer saber,
cigana do realejo? Tchau!
—Essa pressa é
para o Metrô ou está fugindo de você?
—Algo está
brincando comigo.
—Os astros espiam
com zelo, e nos piscam, mesmo que a claridade do dia nos nos permita
vê-los.
—Tchau, cigana do
realejo, estou mesmo atrasada. Como sabe, o meu sábado começa na
sexta.
—Tem alguém com
quem conversar no sábado?
—Não, cigana do
realejo. Por quê?
—Uma florista não
devia desperdiçar um encontro tão interessante.
—Do que fala?
Está maluca também?
—Não sei. Uma
cigana do realejo nunca sabe do que fala.
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 801
Marciano Vasques
Quando temos em mente e coração trazer ânimo, demonstrar preocupação dirigindo palavras de conforto e trazer para si os que também tem os mesmos principios, ao fim de um texto alcançamos uma energia esplendorosa, diria que maravilhosa.
ResponderExcluirO Escritor tem todo o meu respeito e admiração pelo trabalho desenvolvido, os méritos são merecidos, aceite que é de coração um sincero abraço fraternal e desejo de muito sucesso.
Nicinha
Olá,
ResponderExcluirEscrever em forma de diálogo é exaustivo e é prova da sua vocação a escritor cujo dia se comemora hoje de uma forma toda especial...
Seja abençoado e feliz!!!
Abraços fraternos de paz